É aqui que vão parar os azulejos que faltam nas fachadas.
Não comprem azulejos roubados. Serão todos os azulejos que se vêem nas feiras, antiquários, e lojas de velharias pela cidade.
#naocompremazulejosroubados
Lisboa foram dois dias. Literalmente. Cheguei numa segunda-feira de tarde com tempo suficiente para uma visita ao meu antigo espaço de trabalho, recanto de tricot e morada de umas tantas lojas engraçadas. Está diferente, mas sempre com aquele estilo trashy tão lisboeta.
Re-encontrei o meu antigo knitting spot, agora cenário de um qualquer West Side Story lisboeta.
Nessa noite fui ver o concerto que me levou a Lisboa, do qual saí com menos certezas que tinha antes. Antes disso, tempo de fotografar as traseiras do hostel: uma Lisboa tropical, com outono a fingir, no meio do caos da Avenida principal com tantos guindastes pelo céu.
A Noémia iluminada pela manta de São João.
"O Facebook é agora um mercado, onde pessoas preocupadas com o seu valor de mercado usam a intimidade e o seu potencial de entretenimento para aumentar esse valor. (...) O sucesso da ideia de Mark Zuckerberg deveu-se à procura de mercadorias como a terrível sensação de abandono, a solidão incurável, o risco de se ser abandonado, ou expulso, têm no mercado global. Algumas histórias dos blogues, do Twitter ou do Facebook são, por assim dizer, o sucedâneo para algumas camadas da população das revistas de celebridades."
Zygmunt Bauman. Entrevista a Vitor Belanciano em 2013, revisitada em Janeiro 2017. Público.
Zygmunt Bauman. Entrevista a Vitor Belanciano em 2013, revisitada em Janeiro 2017. Público.
Lembro-me de ler isto há quase cinco anos atrás (na antiga revista "Pública") e pensar que estavamos a construir estes artíficios há já alguns anos, mesmo antes "da" rede social existir. E quanto isso me dizia da terrível era da solidão que vivíamos (e vivemos) e que eu sentia tão presente. Nessa altura vivia em Lisboa e senti muito medo do futuro. Hoje parece incrivelmente próximo e contagiante, sendo cada vez mais difícil decidir um afastamento desta mediatização do quotidiano, ou uma aproximação ao outro que não seja mediatizada por estes artifícios. A verdade é que as relações sociais, cada vez menos veiculadas por eventos sociais, nos prendem aos artifícios da imagem digital, e da ideia de partilha do momento, do instante.
A respiração nunca mais será a mesma porque o futuro torna-se frágil, e menos atraente comparado com a vitalidade do momento presente. E no entanto, separados dos outros, só podemos viver o presente um dos outros à distância de cliques e de imagens, sublinhando a nossa profunda solidão e esse abandono (vindo da busca da liberdade pela autodeterminação). Encontrarmo-nos agora, a nós mesmos, neste presente mediatizado e frenético, é cada vez mais difícil.
"A falta de serenidade conduz a nossa civilização a uma nova barbárie. Nenhuma era valorizou mais os seres ativos, isto é, os inquietos. Uma das correções que urge, pois, fazer ao caráter da humanidade é desenvolver, e em grande medida, o seu lado contemplativo."Friedrich Nietzsche, Humano. Demasiado Humano. Obras Escolhidas de Nietzsche. Círculo de Leitores, 1996. (citado por Byung-Chul Han, A Sociedade do Cansaço. Relógio de Água, 2014.)
Went to see Pure Comedy, found Pure Poetry.
"Mas, por muito livres que pareçam alguns dos seus movimentos, Josh Tillman nunca abre mão do controlo. É difícil decifrar, no seu rosto e sobretudo na primeira metade do concerto, o que lhe vai na alma. As diferentes máscaras que vai colocando servem-lhe invariavelmente na perfeição (...) e continuam a fazer de si uma personagem intrigante, capaz de conduzir um concerto com várias "temperaturas". Mas é quando, no regresso para encore, entabula conversa com os fãs, no fosso, ou se deixa impressionar pelo carinho do público ("this is incredible, what the hell"), que se vislumbra, reticente, o cidadão por detrás do artista, ou o rosto por trás de tanta máscara."
Achei que foi muito isto do que escreveu a Lia Pereira no Blitz, apesar de uma sensação geral de pequena desilusão com a máquina super-programada deste espetáculo. Tenho pena que haja cada vez menos espaço (físico e económico) para a música ser o que puder ser em cada lugar, com uma dose de improviso e espontaneidade que já não parece sobreviver em lugar nenhum. No final, ficou-me este sabor amargo, de imaginar a facilidade com que a música seduz para não se chegar sequer à poesia, e muito menos ao conteúdo das palavras, que para mim, sempre foram a razão de querer ouvir.
No Porto, o very typical dá-nos boas surpresas: uma lindíssima boneca da Júlia Cota e galos de Barcelos por pintar!
As sombras mágicas de uma rua por onde passei tantas vezes, na minha outra vida lisboeta, aquela em que a felicidade ainda aparecia pelo meio das sombras.
A casa, que de sonho se transformou em jaula, prendeu-me até há muito pouco tempo a um passado distante, que já não existe. Havíamos de poder desenhar as casas dos nossos sonhos para que eles lá coubessem, em vez de os confiarmos a qualquer sítio onde pareça caber a esperança.
Um sabão que não dispenso para lavar as peças que tricoto (e todas as delicadas), e a pasta de dentes que passeia a usar. Usar português porque-sim não é a minha filosofia, prefiro usar as marcas nacionais cujos produtos são realmente bons. Visitar a mercearia da minha rua é outra sorte quando o merceeiro é tão simpático e atencioso.
Rua da Póvoa |
Num daqueles bairros modernistas, escondidos no meio do Porto, há uma pequena selva e as casas mais bonitas. Este fica entre a Avenida Fernão de Magalhães e a Rua de Santos Pousada.
a.k.a. RBF (Resting Bitch Face), é uma técnica centenária de defesa pública das mulheres em locais públicos. Desde a adolescência a treinar todos os dias a cara-de-poucos-amigos: uma atitude essencial diária que impede o "à vontadinha" dos outros (homens ou mulheres) de realizarem comentários ou olhares em relação ao teu corpo, à tua roupa, ao teu estilo, em suma: a deixarem-te desconfortável. E é a única forma que conheço de te convenceres de que esses olhares e esses comentários (que acontecem de qualquer forma) não têm importância, e de os poderes ignorar (conscientemente).
Durante a adolescência até à idade adulta convenci-me plenamente que essa era uma característica de personalidade e não uma necessidade por ser mulher. Agora sei que ser mulher influenciou em tudo a minha personalidade. Essa "ignorância" teve a vantagem de não acarretar uma culpabilização pelo género. É uma infelicidade que as mulheres não possam ser de outra forma por terem de se ocupar do medo e do receio de andar na rua, nos transportes públicos e em qualquer espaço semi-público, não pelo "facto" de serem mulheres, mas porque isso é argumento para todo o tipo de abusos (nestes incluo homens e mulheres).
Porto |
Machismo não é justiça, é crime
Praça Amor de Perdição, à Cordoaria, Porto
27 Outubro 2017
Sobre este caso (que parece ficção) ler aqui.
"I I fell in love with a bad bad man
Every since I met him
I've been sad sad sad
20 anos de Kazoo, um cd que tenho desde 1997 e que me deixa feliz sempre que regresso a ele. Coincidências felizes: este verão tive uma necessidade súbita de voltar a ouvir aquela versão da I'm free, que já tinha ouvido ao vivo num espetáculo único dos Clã no TNSJ, talvez em 2008. Essa música vem sempre a saber a novidade: uma sensação de liberdade inconsequente sempre que a ouço, que só cabia no "teen spirit" do final dos anos 90, herdeiros da libertação dos anos 60.
E no final, os Clã, já sem canções do Kazoo para tocar, deram-nos duas covers de originais de 1997, uma em parceria com a banda que abriu o concerto (os estetas Best Youth) cantada a duas vozes: No surprises; e outra apresentada pela Manuela Azevedo como a canção número 2, que terminou o concerto com aquela descarga de energia elétrica dos Blur.
Tudo no Rivoli.
Filipa invited me over, luring me with sourdough bread. Having grown in the 90's, and having eaten monstrous amount of Panrico sandwiches (the spanish version of the joyless Wonderbread), sourdough presents itself as the grown up version of bread. It is the parallel situation to that of appreciating wine and cheese-based suppers as soon as you hit adulthood. And, as for the invitation, I said yes. Yes to sourdough!
This was not a simple, 2 hours visit: I was there from 3pm to 7pm on a Saturday, and 9am to 4pm on a Sunday. We surely had a lot to talk about, and lots of sticky dough to babysit, but no doubt sourdough requires dedication. Eventually, we started calling it "the baby".
She started making bread about two years ago, and it was a rocky road until the beautiful crusty bread we ate; "the first ones looked like pancakes!". She introduced me to all the elements involved in the soon to be delicious bread - flours (wheat and rye), the starter (a smelly, living thing), water and salt. Looks easy, right? No. It's not.
This was not a simple, 2 hours visit: I was there from 3pm to 7pm on a Saturday, and 9am to 4pm on a Sunday. We surely had a lot to talk about, and lots of sticky dough to babysit, but no doubt sourdough requires dedication. Eventually, we started calling it "the baby".
She started making bread about two years ago, and it was a rocky road until the beautiful crusty bread we ate; "the first ones looked like pancakes!". She introduced me to all the elements involved in the soon to be delicious bread - flours (wheat and rye), the starter (a smelly, living thing), water and salt. Looks easy, right? No. It's not.
Filipa had been feeding the starter since Wednesday. She was explaining me how much of a labor it is to make sourdough bread. When she started, mistakes occurred - feeding the starter too much, or too late, not leavening the dough sufficiently. The scheduling has to be precise and that's why, every two weeks, she takes a whole weekend for baking loaves. Most of us would complain but she loves the ritual, it feels relaxing to her. Once you get to know Filipa, you start piecing things together - her dedication to knitting and sewing, a deep interest in past portuguese traditions, and her love for cooking and baking - there's a inherent domestic, cozy quality to all of it. You instantly feel serene around her, and I believe that is the main reason I spend so many hours at her place.
Once the bread was cold enough, we feasted, eating it along with Queijo da Ilha (a type of cheese from Azores). She roasted vegetables and toped them with puff pastry, resembling something like a pot pie. Cozyness was there once again, this time at our plate.
And there you go, the climax of this post: a beautiful, crusty sourdough bread.
Textos e fotos/ Text and photos by Matilde Viegas.