"(…) numa altura em que a Europa recebe refugiados e os empurra entre destinos e as posições se extremam, e todos parecemos muito perto da violência. Sim, somos nós todos, qualquer que seja o lado em que estamos, a pedir fogo quando o incêndio já não pára. Os anos de crise reduziram-nos a tolerância, a todos. A Europa vai-se adaptando aos espasmos políticos e financeiros que se sucedem. Foi a Grécia a desafiar a aparente lógica europeia e agora Portugal. Todos se socorrem da palavra democracia para justificar opções. Provavelmente a democracia já não é a mesma coisa, era preciso dar-lhe um novo nome."
Inês Menezes
20-11-2015
Fala com ela na Radar - entrevista com Vítor Belanciano
Os meus gorros estão de novo à venda, agora com a ajuda precisosa da Maria: fotógrafa e modelo destes gorros quentinhos. São tricotados em lã e alpaca — fios de uma marca nórdica — e são muito muito quentes. A loja é esta: esta, no Etsy.
O meu sonho — mesmo, mesmo — era poder desenhar de raíz uma dessas poucas "marcas" de fibras portuguesas. Fibras são, na gíria das tricotadeiras e afins, fios feitos de coisas que podem ser naturais como a lã e o algodão, ou artificiais como o acrílico.
Sonhava em desenhar logótipos, etiquetas, imaginar sites, lojas online; sonhava em imaginar fios, de texturas diferentes e cores infinitas, criar modelos e peças em tricot e crochet, kits DIY e outras coisas que tal, com tanto bom gosto como é possível. Mas sem a tentação de um gosto inglês (ou escocês), ou nórdico, ou mesmo norte-americano.
Pérolas do Ricardo Araújo Pereira nas suas crónicas da Visão (folheada sempre no dentista)
"A austeridade é como as cerejas."
"Se o resgate é isto, prefiro o sequestro."
"Igreja Universal do Reino do Empreendedorismo."
Por causa do nome do fio: João, voltei ao crochet para fazer a derradeira manta de quadrados. Chamei-a de manta de São João, porque me lembra as noites de verão infinitas e quentes, manjericos e luas cheias, girassóis e praia.
O jogo amoroso português, muito complexo, muito interessante, em que os homens fazem-se de brutos… e as mulheres… é muito interessante o jogo. Muita estratégia, muito saber, muita jogada… E depois com acessos torrenciais de sinceridade, de choro, cenas com uma torrencial… que só pode ser sincera! E isso… é preciso muito saber do jogar, a manipulação... e depois “o toma lá".
A cultura portuguesa, no sentido amplo da cultura amorosa portuguesa é declaradamente sentimental. Declaradamente baseada na pena ou na desgraça e na lágrima… que não tem a conotação negativa.
E isso é uma coisa muito boa: as pessoa não têm medo de chorar, num filme ou qualquer coisa mais sentimental… Porque também… o sentimentalismo, o ódio ao sentimentalismo é uma moda, é uma coisa que data do romantismo e que foi muito agravado agora no século XX com as teorias literárias. O sentimentalismo em si o que é que tem de errado? O que é que tem de errado a manipulação de sentimentos, ou a apresentação de sentimentos de pena ou… exacerbados?
(…) A relação amorosa portuguesa é muito muito sentimental. É muito muito lamechas, ou seja, mas lamechas num sentido profissionalíssimo. Nós estamos a falar numa craveira de lamechas… ui, sexto, sétimo “dan” de lamechice. Tudo o que seja: carneiro-mal-morto, pobre-de-mim, desgraçado-estou-para-aqui-caído, não sei quê, em Portugal estamos a falar de mestres. São todos, desde os cinco anos já são mestres.
Miguel Esteves Cardoso
A propósito deste desabafo — aquilo que parece ser o encortiçamento do turismo nacional, com muito paternalismo à mistura — fico desolada com o estado a que chegou uma cidade como Lisboa.
De como a descaracterização típica de uma cidade-de-ninguém (com pouco sentimento de pertença: quem é de lá não mora lá, etc.) pode fazer tanto dano à cultura — no seu sentido mais abrangente — de um país. Fica a ideia, tão falsa quanto tentadora, de enfiar várias coisas portuguesas (portuguese stuff) pela goela abaixo do turista, junto com um golinho de ginja no Rossio. É o turismo-desenrasca. Que o turismo oficial tão bem comprou, com a mesma avidez de um tasqueiro oportunista.
Este artigo, que data de há um ano — quando eu ainda morava lá — mostra como varrer portugueses de Alfama não só vai ser fácil, como já está a acontecer. A experiência deprimente de passear nas ruas semi-desertas de Alfama e ser convidada a jantar em inglês por meia-dúzia de donos de restaurante ilustra bem as coisas. O bairro não está deserto, nem está habitado, e parece que sobram os deslocados, os muito pobres e os que exploram os turistas. Os portugueses que trabalham (os poucos que ainda o fazem) vivem do outro lado do rio ou a vários quilómetros de distância do Tejo. A vida ribeirinha de Lisboa é uma tristeza: repetir o percurso Santa Apolónia-Alcântara diariamente durante muitos meses é experiência suficiente para sabê-lo.
Se por um lado existe uma sensação de vida ao raiar do sol, ao final da tarde sobram os grupos de turistas queimados que rumam ao Chiado e ao Bairro Alto para a vida noturna. Os lisboetas desapareceram todos, de carro, de barco, de metro e de autocarro para outras paragens menos barulhentas e tão ou mais descaracterizadas. Sobra uma cidade meio-fantasma, nem segura, nem insegura. Mal segura, mal amanhada.
Neste turismo, o desrespeito por cada coisa — por cada rua, e por cada paisagem, por cada pastel de nata — traduz-se num profundo desprezo pela cultura local: o conhecimento do contexto, da pertença de cada coisa. O turismo massificado faz um bolo da cultura, põe tudo na mesma panela para aceleração da experiência, e pelo caminho, destrói tudo o que há de bom nos pormenores.
Acho que nem as andorinhas se safaram…
Os portugueses que eu conheço vivem o amor com uma intensidade, como se fosse a coisa exclusiva, dão uma importância ao amor extraordinária. É uma coisa maravilhosa. O amor, desde pequeninos… domina tudo, domina qualquer outra coisa. E por isso é que são, eu acho, relativamente felizes nos amores, porque investem tanto, tanto, tanto, estão sempre a pensar: “O que é ele fez que eu fiz mal?”, “O que é que eu faço…e telefono… e digo…que merda… porra”.
O que é bonito nos portugueses, e isto é que é mesmo bonito — eu acho que aí é diferente — os portugueses no amor são o contrário de egoístas: só pensam no outro, na pessoa amada. Não pensam nunca… aquela coisa americana e inglesa “It’s not about you”, aquela coisa egocêntrica que uma pessoa vê na literatura, n’ “O sexo e a cidade”, em que procuram alguém para satisfazer as necessidades dela, e o problema é lutar contra esse egoísmo. E em Portugal não, em Portugal (…) a pessoa que ama coloca-se numa posição de insegurança e de procurar satisfazer o outro. Um investimento gigantesco (…) uma importância gigantesca que dão à relação amorosa. É muito, muito forte.
Miguel Esteves Cardoso
Voltar a blogue, voltar ao texto. Resolvi trazer de volta as ideias sábias e curiosas do MEC, desta entrevista. As coisas que ele diz sobre os portugueses deliciam-me e dão esperança, quando esta parece escassear.
Voltar ao ritual da infância dos sábados de manhã: levantar muito cedo para ver filmes antigos. Este era dos meus favoritos e deverá ter vindo também daí a paixão secreta pela vida (e pelas casas e bolos) dos suecos.
A preparar coisas tão importantes como bonitas.
Ou o lado prático de uma tese que escrevi há quatro anos: como valorizar simbolicamente o comércio tradicional da cidade do Porto, tendo por base o potencial da memória.
Na prática, tudo é menos romântico, mas no fundo é a própria concretização dos sonhos; no final, essa concretização pode ficar mais aquém do que sonhamos, mas é sempre uma concretização, nem que seja de tentativas.
Esperemos que no futuro, esta história seja ainda mais rica do que já é; e que mais pessoas a conheçam! Em breve, vamos dá-la a conhecer.
Há 10 anos fiz uma foto-montagem de mãe e filha. Este blog já tinha nascido e eu tinha menos 10 anos. Falar de anos é um passatempo deste blog mas uma década é uma medida que ainda não encaixo na vida, é grande demais para o que fui e o que ainda sou.
Sempre no pânico de ser fantasma de mim mesmo, gosto de me rodear de fantasmas, antepassados, referências, imagens, tudo a fazer dar sentido ao tempo e aos lugares onde estou. Até um blog pode ser uma ampulheta da vida, é só querer.
Sempre no pânico de ser fantasma de mim mesmo, gosto de me rodear de fantasmas, antepassados, referências, imagens, tudo a fazer dar sentido ao tempo e aos lugares onde estou. Até um blog pode ser uma ampulheta da vida, é só querer.
Tricotar uma amostra (para o workshop) com esta lã tão bonita e fofa e fazer quadrados com o azul mágico da João. Que tarde de domingo de primavera.
aniki bébé
aniki bóbó
passarinho tótó
berimbau, cavaquinho
salomão, sacristão
tu és polícia,
tu és ladrão.
Há um ano comecei o meu 365 com esta fotografia de uma porta antiga da Rua Serpa Pinto. Criei uma hashtag só minha com o nome #um365 para fazer uma colecção de 365 fotos ao longo do mesmo número de dias. Fui batoteira e não terminei: faltam-me 103 fotografias e o ano já passou a correr. Aos trambolhões mesmo, com tombos e mazelas pelo meio. Mas estou bem, agora, mesmo com menos 103 fotografias.