Dos vazios que fizemos

By sufragista - dezembro 16, 2017



"O Facebook é agora um mercado, onde pessoas preocupadas com o seu valor de mercado usam a intimidade e o seu potencial de entretenimento para aumentar esse valor. (...) O sucesso da ideia de Mark Zuckerberg deveu-se à procura de mercadorias como a terrível sensação de abandono, a solidão incurável, o risco de se ser abandonado, ou expulso, têm no mercado global. Algumas histórias dos blogues, do Twitter ou do Facebook são, por assim dizer, o sucedâneo para algumas camadas da população das revistas de celebridades."

Zygmunt Bauman. Entrevista a Vitor Belanciano em 2013, revisitada em Janeiro 2017. Público.


Lembro-me de ler isto há quase cinco anos atrás (na antiga revista "Pública") e pensar que estavamos a construir estes artíficios há já alguns anos, mesmo antes "da" rede social existir. E quanto isso me dizia da terrível era da solidão que vivíamos (e vivemos) e que eu sentia tão presente. Nessa altura vivia em Lisboa e senti muito medo do futuro. Hoje parece incrivelmente próximo e contagiante, sendo cada vez mais difícil decidir um afastamento desta mediatização do quotidiano, ou uma aproximação ao outro que não seja mediatizada por estes artifícios. A verdade é que as relações sociais, cada vez menos veiculadas por eventos sociais, nos prendem aos artifícios da imagem digital, e da ideia de partilha do momento, do instante.

A respiração nunca mais será a mesma porque o futuro torna-se frágil, e menos atraente comparado com a vitalidade do momento presente. E no entanto, separados dos outros, só podemos viver o presente um dos outros à distância de cliques e de imagens, sublinhando a nossa profunda solidão e esse abandono (vindo da busca da liberdade pela autodeterminação). Encontrarmo-nos agora, a nós mesmos, neste presente mediatizado e frenético, é cada vez mais difícil.

"A falta de serenidade conduz a nossa civilização a uma nova barbárie. Nenhuma era valorizou mais os seres ativos, isto é, os inquietos. Uma das correções que urge, pois, fazer ao caráter da humanidade é desenvolver, e em grande medida, o seu lado contemplativo."

Friedrich Nietzsche, Humano. Demasiado Humano. Obras Escolhidas de Nietzsche. Círculo de Leitores, 1996. (citado por Byung-Chul Han, A Sociedade do Cansaço. Relógio de Água, 2014.)

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