Tenho endometriose
A resposta simples é: a medicina ocidental não quer saber da saúde das mulheres, e no que toca ao trabalho, já sabemos que assim é só mais uma desculpa do sistema para castigar as mulheres de prosseguirem as suas carreiras profissionais. Estes são os pilares do sistema que permitem e validam que estas doenças sejam praticamente ignoradas até há muito pouco tempo.
Aquilo que permite que isto aconteça até hoje, sabendo que há registos de endometriose desde há pelo menos 200 anos são as superstições e preconceitos culturais deste continente que se considera tão progressista culturalmente: uma normalização histórica das dores das mulheres (principalmente relacionadas com o que se passa nos seus úteros); um viés em relação à saúde feminina, sempre tornada menos relevante cientificamente e acima de tudo, sempre opaca, mal e pouco investigada e com intenção de afastar informação e ação por parte das mulheres em relação aos seus corpos, aquilo que hoje se chama de literacia de corpo; e não menos importante, uma glorificação doentia do multitasking, da super-mulher-mãe-esposa-dona-de-casa que resiste estoicamente desde os anos 80, como se esse fosse (ainda) o preço a pagar pela re-entrada no mercado de trabalho.
Não me parece uma coincidência que numa altura em que mais se discute e alerta para estas doenças que afetam o útero como a endometriose/ adnomiose, a síndrome do ovário poliquístico, entre outras doenças com relação com a fertilidade — se esteja também a assistir a uma degradação acelerada dos poucos direitos reprodutivos que as mulheres (e pessoas com útero) tinham tomados como garantidos nas sociedades europeias e norte-americanas, como resultado de décadas de luta pelo direito ao aborto médico seguro e ao planeamento familiar sem vieses moralistas.
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